Segundo portaria publicada recentemente em Diário da
República, extinguem-se os Centros Novas Oportunidades e estreiam-se os Centros
para a Qualificação e Ensino Profissional. Mas as alterações não são apenas de
nome. No final do mês de março a formação profissional em Portugal sofreu uma
alteração de paradigma significativa.
Primeiro, deixa-se de apostar na aprendizagem ao longo
da vida e deixa-se de reconhecer as aprendizagens informais como fontes de
aprendizagem e de conhecimento. Consuma-se o fim dos processos RVCC e tudo
indica que os cursos EFA seguirão o mesmo caminho, tendo em conta que a última
candidatura para EFAs terminou de forma caricata: com o Governo a suspender a
análise das candidaturas até nova ordem, ordem essa que ainda não chegou em
cerca de ano e meio.
A visão de negação da aprendizagem ao longo da vida e
do reconhecimento de competências e conhecimentos adquiridos de forma informal
e não-formal é uma visão elitista e ortodoxa do ensino.
Segundo, os novos Centros de Formação parecem estar a
ser desenhados para ir mais de encontro à visão do ensino dual que o Governo
tanto ambiciona. Já sabemos que Nuno Crato quer impor a regra de que aluno que
chumbe deve ser reencaminhado para ensino profissional. Essa ideia, só por si,
tem pelo menos dois erros fundamentais: 1) É considerar que o ensino
profissional é um ensino de segunda, reservado por isso para quem chumba e
não-opção para quem não chumba; 2) Achar que alunos que chumbam podem ser
privados de progressão em vias estritamente académicas.
O ensino dual é um ensino que impõe uma visão dualista
que opõe a mente ao corpo e desvaloriza o trabalho manual, quando, uma
sociedade moderna e que tem o trabalho no centro deve desenvolver-se na
integração entre mente e corpo.
Terceiro, a reestruturação da formação profissional
levada a cabo está a levar também ao despedimento de muitos formadores; muitos
deles estavam sujeitos à precariedade mais inacreditável.
Já no final de 2011 foram despedidos mais de 200
formadores de CNO a quem não foi paga indemnização por ordem do secretário de
Estado do Emprego. Estes formadores tinham contrato de 3 anos, e por isso,
tinham direito a indemnização por serem despedidos antes do fim do contrato.
Mas não aconteceu assim, tendo-se recorrido a tribunal.
Durante o ano de 2012 e agora em 2013 encerram-se os restantes
CNO, o que leva ao despedimento de muitos mais formadores.
Em simultâneo, procede-se ao despedimento de cerca de
1000 formadores externos do IEFP, os quais são lançados na rua sem nada porque
trabalharam anos a recibos verdes. Falsos recibos verdes, entenda-se. Na
generalidade eram pior remunerados do que formadores em entidades privadas,
adquiriram anos de experiência junto de públicos específicos e em dispositivos
formativos específicos e são agora despedidos, depois de um concurso que deixou
margem para todas as dúvidas, mas que estava pensado para dar preferência a
professores e não a formadores, o que por si só mostra novamente a nova
tendência para a formação em Portugal.
Os dispositivos que se estão a desenhar parecem ser
para transformar a formação profissional numa espécie de currículo balternativo
à escola oficial, em vez de serem dispositivos pensados para a
população adulta. Até porque cursos de formação para jovens já existiam e têm
funcionado continuamente: Cursos de Aprendizagem, os CEFs ou, em certa medida,
os CET. Por isso, não se pretende com esta reformulação de Centros e de
despedimentos/contratações oferecer dispositivos que não existiam. Pretende-se
sim fazer da formação a escola para os que o Nuno Crato achar que não são capazes
de frequentar o 'ensino normal'.
Não estou com isto a dizer que não se deveria reformular
os CNO. Acho que se deveria mexer e a fundo, começando pelo funcionamento que
assentava em gestão por objetivos e que, na prática, garantia mais
financiamento aos CNO que mais formandos reconhecessem e qualificassem. Daqui
veio o facilitismo tantas vezes criticado. Para combater o facilitismo deveria
combater-se o financiamento baseado em gestão por objetivos quantitativos.
No entanto, o que o Governo está a fazer não é
redesenhar os CNO. Está a redesenhar a escola, elitizando o reconhecimento de
aprendizagens, criando escolas diferentes para os que têm boas notas e para os
que têm más notas e ignorando que a formação profissional, até pelo seu
carácter andragógico, é um conjunto de dispositivos destinados a adultos e à
sua necessidade de (re)construção de competências e projetos de vida.
Parecem estar a ser dados muitos passos atrás no
ensino e na conceção de escola...
Luís Gomes
Salvaterra
de Magos, 10 de Abril de 2013
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